Edição extra. Sobre o primeiro dia da Argus Latin America Carbon Conference 2025.
- Art Dam
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Terça-feira, 24 de junho de 2025.
A abertura do evento foi realizada por Camila Dias (Brazil Bureau Chief and Country Manager, Argus) que destacou ser o primeiro evento do tipo pela empresa no Brasil, marcando também o lançamento de um novo relatório voltado ao mercado de carbono. Detalhes ao final desse artigo.
Em seguida, Erisa Senerdem (Global Carbon Lead Argus) apresentou a perspectiva global da Argus para os mercados de carbono. Aqui os highlights.
1. Oferta supera demanda – e sufoca o mercado. O mercado voluntário (VCM) enfrenta excesso crônico de créditos desde 2008. Mesmo com aumento na demanda recente (2023–2025), a oferta (emissões) — puxada por renováveis — continua superando a demanda (retirements), que se concentram em projetos AFOLU e no fim do ano. Isso pressiona preços e pode minar o impacto climático.
2. Preços estáveis, mas sensíveis. Os preços variam por tipo de projeto, com bônus para remoções e co-benefícios sociais. A elasticidade entre preço e demanda existe, mas não é linear. Em um mercado ainda desregulado e movido por percepção, liquidez continua limitada.
3. Integridade define confiança. Sem regulação robusta e mecanismos de estabilidade, o mercado é volátil. Casos como Rimba Raya vs. Katingan mostram que classificações de riscos (BeZero) nem sempre refletem a situação real. Integridade, padronização e transparência são vitais para credibilidade.
4. Créditos que atendem aos “Core Carbon Principles” (CCP) da ICVCM: muito potencial, pouca tração. Mesmo com metodologias aprovadas desde 2024, os créditos CCP ainda não ganharam escala. Estão concentrados em poucos setores e têm prêmios de preço modestos. O foco regulatório é positivo, mas o mercado resiste.
5. CORSIA: gigante em pausa. Com 129 países participantes, o CORSIA promete muito — limitar emissões da aviação internacional a 85% dos níveis de 2019 — mas entrega pouco até agora. Poucos projetos, regras complexas e incertezas políticas (como uma possível saída dos EUA) limitam seu impacto atual.
O segundo painel, moderado por Felipe Kury (FK Energy), explorou dinâmicas de mercado e trouxe à tona experiências latino-americanas, como o projeto Vida Manglar na Colômbia e as iniciativas do setor cimenteiro no Chile, além da urgente necessidade de implementação do mercado regulado de carbono no Brasil (ETS).
Elen Perez (Conservation International) apresentou o projeto Vida Manglar, um dos primeiros projetos de carbono azul do mundo e o primeiro REDD+ voltado exclusivamente para manguezais na Colômbia. Desenvolvido no Golfo de Morrosquillo, o projeto combina conservação ambiental com desenvolvimento comunitário, protegendo mais de 8.500 hectares e beneficiando diretamente 571 famílias locais. Ele visa evitar o desmatamento, promover educação climática e gerar renda por meio do turismo sustentável, com atenção especial à igualdade de gênero.
O projeto já emitiu cerca de 170 mil tCO₂e verificados e certificados sob os padrões VCS e CCB. Elen também destacou os desafios de governança, os gargalos financeiros enfrentados por iniciativas como essa e o papel crescente da blended finance, além da necessidade de fortalecer a integridade e a credibilidade da certificação de carbono.
Aldo Cerda (CEO da SCX) apresentou um panorama global sobre a precificação de carbono no setor de cimento, destacando a enorme disparidade de preços por país e o papel emergente dos mecanismos de compensação. Ele mostrou que, embora o Brasil ainda opere em fase piloto (com preço zero), países como UE e Reino Unido já aplicam valores superiores a US$ 90/tCO₂e. Aldo destacou que o uso de offsets tem sido particularmente expressivo na Colômbia, com 43% de isenção fiscal via compensações, contra apenas 14% no Chile.
Ele também comparou o desempenho de instrumentos de mercado, apontando que os EACs (como I-RECs) já proporcionaram mais reduções de emissões no Chile do que os próprios créditos de carbono. As projeções até 2030 mostram que a energia renovável e os certificados ambientais terão papel dominante nas reduções de GEE. Por fim, Aldo observou que o setor financeiro tem avançado com lentidão, sugerindo a necessidade de maior agilidade para que os instrumentos de mercado ganhem escala real.
Laura Albuquerque (Chief Climate Officer, Future Climate), destacou que os créditos de carbono estão sendo cada vez mais usados como instrumentos para rastrear investimentos climáticos. Ela mencionou o avanço do primeiro projeto de BECCS no Brasil, sinalizando um novo momento para tecnologias de remoção. Comentou também sobre os altos e baixos do mercado e alertou que o papel dos governos subnacionais ainda precisa ser melhor definido. Laura enfatizou que o Brasil agora tem maior clareza contábil e jurídica sobre o que é um crédito de carbono, lembrado que anteriormente “muita gente assinava contratos de milhões de dólares sem saber exatamente do que se tratava legalmente”. Por fim, ressaltou a existência de graves desafios de governança e a necessidade de processos robustos de due diligence no setor.
Antes de encerrar o segundo painel, foram debatidas as tensões entre Norte e Sul globais, o papel estratégico da COP30 e a importância de converter compromissos climáticos em ações financeiras efetivas.
Na sequência, Julia Sekula (Terradot) apresentou a tecnologia de ERW (“Enhanced Rock Weathering”) como uma via promissora para remoções de carbono com benefícios simultâneos à agricultura e mineração.
Julia apresentou uma introdução científica e técnica sobre o intemperismo de silicatos como solução climática natural e emergente. Ela explicou o ciclo geoquímico natural em que a chuva interage com rochas ricas em silicatos, liberando íons como cálcio e magnésio que reagem com CO₂, formando bicarbonatos que são transportados aos oceanos, onde o carbono é armazenado por milênios.
Em seguida, trouxe estudos que exploram o intemperismo acelerado — a aplicação intencional de rochas moídas no solo para captura de carbono atmosférico — destacando o alto potencial do Brasil, mas também os desafios associados, como logística, monitoramento (MRV) e escalabilidade. Foram citados artigos científicos que sustentam o potencial de co-benefícios agrícolas e o uso de resíduos industriais.
Julia também apresentou o caso da Terradot, empresa que atua com ERW no Brasil, com foco no uso de rochas moídas em solos agrícolas, incluindo dados de campo próximos à pedreira de Mandaquari (PR) e reflexões sobre como quantificar, verificar e certificar essas remoções ainda é um desafio. A fala conectou ciência, aplicação prática e inovação como caminho promissor para soluções climáticas com impactos positivos na agricultura e na mineração.
Fechando o primeiro dia do evento, Isabela Morbach (CCS Brasil) falou sobre o papel da captura e armazenamento de carbono (CCS) em processos industriais.
Isabela Morbach apresentou uma visão estratégica sobre o papel da captura e armazenamento de carbono (CCS) na transição climática, com foco na indústria de óleo e gás (O&G). Partindo da provocação “Um setor fundado na extração de carbono pode se tornar a espinha dorsal da descarbonização industrial?”, ela respondeu afirmativamente, destacando que muitos setores não têm alternativas viáveis de descarbonização além do CCS — e que o setor de O&G, por seu conhecimento técnico e infraestrutura, pode ser chave nesse processo.
Isabela mostrou projeções da IEA que apontam o CCS como responsável por cerca de 26% das reduções de CO₂ necessárias até 2050. Reforçou que o setor de O&G pode viabilizar essa ambição aproveitando dutos, poços e plataformas, e apoiando financeiramente hubs compartilhados de CCS e projetos como BECCS.
A apresentação também incluiu um panorama de projetos no Brasil, que vão de aplicações industriais a tecnologias emergentes como DAC (captura direta do ar), com exemplos como o projeto da Petrobras no pré-sal e hubs de BECCS em SP e RS. No entanto, Isabela alertou que sem precificação efetiva do carbono, os projetos de CCS não se sustentam economicamente, dados seus altos custos (de US$ 60 a US$ 300 por tonelada).
Por fim, ela destacou a importância da interoperabilidade entre mercados voluntário e regulado via o SBCE e apontou os principais desafios regulatórios do Brasil: clareza sobre responsabilidade pós-injeção, licenciamento e reconhecimento de créditos. O Brasil, segundo ela, tem o potencial para ser um hub global de remoções de alto impacto — se conseguir alinhar política climática, infraestrutura e financiamento.
Esse é um resumo do que foi o primeiro dia da Argus Latin America Carbon Conference. Amanhã, os painéis de encerramento.
A Argus Carbon é uma plataforma global de inteligência especializada em mercados de carbono, cobrindo tanto o mercado voluntário (VCM) quanto o regulado. Ela oferece:
Benchmarks de preços e spreads energéticos avançados, como faísca e escuros, ideais para análises de custo e precificação.
Conteúdo analítico atualizado, incluindo notícias, comentários de mercado, insights regulatórios e tendências setoriais.
Ferramentas personalizáveis e integradas, como alertas em tempo real, API/FTP, plugin para Excel e acesso via portal.
Relatórios periódicos e dashboards interativos, que apoiam a tomada de decisão de traders, analistas e gestores ambientais.
Combinando tecnologia, conteúdo e personalização, a Argus Carbon atende profissionais que precisam de dados confiáveis, análises relevantes e suporte estratégico em tempo real.